Universidade afirma posição crítica
Considerando a aprovação pela Câmara Federal, em primeiro turno, da PEC
395/2014, que autoriza a cobrança de anuidades, por instituições públicas, para
cursos de extensão e de mestrados profissionais, a Reitoria da Universidade
Federal da Bahia reitera a sua posição crítica ao texto aprovado pelas
seguintes razões:
1. A proposta original do deputado Alex Canziani (PTB/PR), de
09/04/2014, previa “excluir do princípio constitucional da gratuidade, nos estabelecimentos oficiais, as atividades
de
extensão caracterizadas como cursos de treinamento e aperfeiçoamento,
assim como os cursos de especialização.”
Deste modo, o Art 206, IV, da Constituição passaria a assegurar “gratuidade do
ensino público nos estabelecimentos oficiais de educação básica e, na educação
superior, para os cursos regulares de graduação, mestrado e doutorado.”
A proposta original não despertou grandes controvérsias e não contou com
a oposição desta Universidade porque ela apenas elucidaria juridicamente
distintos comportamentos de fato existentes pelos quais algumas universidades
públicas cobram por atividades de extensão e outras não. Ademais, atividades de
treinamento e aperfeiçoamento, na forma de atividades de extensão, não têm um
papel estruturante na configuração das atividades acadêmicas. Se aprovada neste
termos, a PEC remeteria para cada universidade, nos marcos de sua autonomia, a
decisão sobre cobrança dessas atividades de extensão.
2. Entretanto, em 17/09/2015, o substitutivo do relator, Deputado Cleber
Verde (PRB-MA), alterou a redação da proposta original de modo que a
Constituição Federal passaria a assegurar
a “gratuidade do ensino público nos estabelecimentos
oficiais, salvo, na educação superior,
para os cursos de extensão,
de pós-graduação lato sensu e de
mestrado profissional, exceções para as quais se faculta sua
oferta não gratuita, respeitada a autonomia universitária.” (grifos nossos)
A emenda ora aprovada pela Câmara Federal recebeu, no devido tempo, a
nossa críticaprecisamente pela inclusão dos mestrados profissionais dentre as
atividades pelas quais as instituições públicas podem passar a cobrar
anuidades.
3. A nossa crítica fundamenta-se no desequilíbrio e mesmo
desestruturação que tal medida trará ao sistema nacional de pós-graduação,
pelas seguintes razões:
. Os mestrados profissionais são parte intrínseca do sistema nacional de
pós-graduação, previstos em legislação desde a implantação deste sistema pela
CAPES na década de 1970, com equivalência para efeitos legais aos mestrados
acadêmicos. São, portanto, cursos de pós-graduação stricto sensu,
ao lado dos mestrados acadêmicos e doutorados. Os mestrados profissionais
distinguem-se dos acadêmicos apenas pelos objetivos de formação, mais voltados
à preparação para a pesquisa e docência, no caso dos mestrados acadêmicos, ou
para a melhor qualificação profissional ou da docência, no caso dos mestrados
profissionais.
. Com o incentivo à expansão e diversificação da pós-graduação nos
últimos quinze anos, cresceu substancialmente a oferta desta modalidade de
pós-graduação stricto sensu. No conjunto do país, considerando os
cursos de mestrado com avaliação entre 3 e 5 (faixa de variação comum às duas
modalidades, acadêmico e profissional), temos 2817 mestrados acadêmicos e 589
mestrados profissionais. Na UFBA, por exemplo, em 2014, dos 128 cursos de
pós-graduação stricto sensu ofertados, 12 são mestrados
profissionais, 65 mestrados acadêmicos e 51 doutorados. Estes números indicam,
portanto, a parcela já significativa de mestrados na modalidade profissional.
. No atual cenário de restrições orçamentárias, com as universidades
públicas e a CAPES vivenciando tais restrições, a aprovação desta emenda
representará, na prática, uma indução a que os programas de pós-graduação das
universidades públicas migrem seus mestrados para tal modalidade, ainda que
artificialmente, como forma de captação de recursos e de sobrevivência neste
cenário de restrições ao financiamento público à educação. São estas
circunstâncias, a nosso ver, que explicam a introdução deste dispositivo no
substitutivo aprovado em setembro do corrente ano e, açodadamente, aprovado
pelo plenário um mês depois, quando já se instalava uma crise no financiamento
público à pós-graduação. A desestruturação no sistema da pós-graduação que
poderá advir com a aprovação dessa emenda ocorrerá porque os mestrados
profissionais não mais serão criados pelos seus objetivos educacionais
intrínsecos, mas pela possibilidade de aporte de recursos que eles poderão
trazer. Tal tendência terminará por impactar a própria política de estado da
oferta de educação superior pública e gratuita.
4. Cabe assinalar, por fim, que a CAPES não financia os mestrados profissionais,
salvo aqueles relacionados à formação de professores da educação básica, na
suposição de que os mestrados profissionais podem ser financiados via acordos
com os setores da sociedade interessados no aprimoramento de seus
profissionais. Tal já ocorre com acordos das universidades públicas com setores
dos estados, visando, por exemplo, à formação de profissionais na saúde e na
administração pública, e com setores da iniciativa privada. Obstáculos
burocráticos para tais acordos certamente existem, como existem para quaisquer
atividades do estado, e devem ser criticados e enfrentados, mas não podem ser
usados como pretexto para apoio a uma medida que desestruturará nosso sistema
de pós-graduação e representará forma de ensino pago em instituições públicas
de educação superior.
Por tais razões, a Universidade Federal da Bahia tem a expectativa de
que, com um maior esclarecimento dos riscos envolvidos nessa emenda, a Câmara
Federal possa reavaliá-la quando do segundo turno da votação.
Salvador, 23/10/2015
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