quarta-feira, 26 de novembro de 2014

Fraudes e violações a direitos humanos marcam exploração do carvão na Índia

Luis A. Gómez | Calcutá - 23/11/2014 - 06h00

Em um país cuja produção de energia depende basicamente do carvão, o uso do mineral rendeu negócios milionários a várias corporações e, ao mesmo tempo, provocou a desapropriação e a morte de milhares de indígenas
  
No dia 10 de agosto de 2013, aconteceu um acidente na mina de carvão de Kulda, no Estado de Odisha, ao norte da Índia. Pelo menos 14 trabalhadores morreram com o desabamento em um reservatório de resíduos e foram sepultados pela pedra. A companhia paraestatal que opera a mina, Mahanadi Coalfields, decidiu buscá-los com maquinário pesado e revirou com pressa todo o local. As famílias dos mortos foram recuperando-os por partes entre as pedras: durante três dias, as máquinas tiraram dali braços, pés, pedaços de carne.

Menos de duas semanas depois, a mina foi reaberta para produzir suas regulares 5 mil toneladas diárias de carvão. Nenhuma família recebeu a compensação prometida. Mas o caso de Kulda não é isolado, como demonstram os relatórios de ONGs e os processos judiciais recentes, como o iniciado em maio passado contra a Reliance Power pela instalação de um complexo minerador em Singrauli, no centro da Índia: desaparecimentos forçados, compensações por debaixo do pano e a derrubada de casas com seus habitantes dentro são alguns dos crimes dos quais a companhia é acusada.

Divulgação/Greenpeace








Catadores trabalhando nas minas de carvão na Índia

Desde que, em 1994, a Índia abriu suas minas à exploração paraestatal e privada, mais de 218 concessões de exploração de carvão foram entregues. A maioria das minas a céu aberto, como Kulda, derrubam as florestas que protegem os povos ancestrais e deslocam comunidades inteiras. Em todas trabalham “catadores” que vivem de transportar e comercializar os resíduos de baixa qualidade das minas, caminhando descalços sobre perdas ardendo, expostos a explosões ou incêndios repentinos. Muitos são crianças, quase todos são indígenas deslocados pela mineração (como os de Kulda).

O negócio não é pequeno: a Índia é o terceiro maior produtor mundial de carvão. Sua riqueza carbonífera chegou a 613 milhões de toneladas em 2013 e é utilizada, em sua grande maioria, para produzir 71% da energia elétrica do país, em cidades como Nova Déli, Mumbai e Calcutá, ou em imensas refinarias de aço que foram construídas nos últimos 20 anos (propriedade das mesmas corporações que controlam o carvão e a produção de energia elétrica).

Assim, extrair carvão é uma prioridade e, como consequência, as concessões foram entregues de maneira direta, sem concurso. Mas a história de privatizações e de desapropriações teve uma virada inesperada três meses atrás: em uma ação judicial sem precedentes na Índia (e no mundo), a Corte Suprema decretou que as concessões eram ilegais, ordenando seu fechamento e posterior licitação, assim como pagamentos milionários como compensação para o Estado.

Perdas e ameaças corporativas

Em 2012, o escritório do auditor-geral da Índia ordenou a avaliação das concessões de mineração de carvão. Depois de vários processos de interesse público e de numerosas denúncias de abusos, decidiu-se revisar todo o processo. Em dois anos de investigações, foram descobertas muitíssimas violações às leis que regem a mineração, os direitos dos povos indígenas e a administração e o uso das florestas na Índia, sem contar as violações aos direitos humanos.

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